20120613

As colunas Salazar e Carmona

Como se fosse um templo maçónico, o Terreiro do Paço tem duas colunas à entrada. Mas, aquelas que estão no Cais das Colunas não se chamam Boaz nem Jachim. Têm outros nomes, que estão inscritos em grande destaque na base das mesmas: "SALAZAR" e "CARMONA". Poucos lisboetas conhecerão este facto, raros serão os portugueses que sabem isto e quase nenhum turista reparará, pois a informação não figura nos roteiros turísticos. Apesar de todos os dias haver quem se faça fotografar junto às colunas, mal se vê os nomes dos dois governantes do Estado Novo, pois estes estão parcialmente tapados pelo lodo. Contudo, de vez em quando, alguém olha com mais atenção e fica estupefecto quando descobre os nomes de dois chefes de Estado do tempo da Ditadura. É então, nesse momento de surpresa, que notam ainda em outras inscrições nas colunas, que também são difícieis de ler. São duas mensagems gravadas na pedra, num dos locais mais simbólicos e turísticos da capital portuguesa. Afinal, o que está inscrito nas colunas e como foi ali parar? Explique-se então que, em Julho de 1938, o então Presidente da República, o general Óscar Carmona, fez a primeira viagem de um chefe de Estado português às colónias. Depois, em Junho de 1939, fez a segunda viagem. De forma a assinalar para a posteridade o acto histórico, foi decidido gravar na pedra uma mensagem do Presidente da República e outra do Presidente do Conselho: AQUI EMBARCOU O CHEFE DO ESTADO PARA A PRIMEIRA VIAGEM ÀS TERRAS ULTRAMARINAS DO IMPÉRIO: SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE E ANGOLA. XI DE JULHO - XXX DE AGOSTO DE MCMXXXVIII COM A CERTEZA DE QUE FALA PELA MINHA VOZ PORTUGAL INTEIRO, PROCLAMO A UNIDADE INDESTRUTÍVEL E ETERNA DE PORTUGAL GENERAL CARMONA A SEGUNDA VIAGEM DO CHEFE DO ESTADO ÀS TERRAS ULTRAMARINAS DO IMPÉRIO: CABO VERDE, MOÇAMBIQUE E ANGOLA. XVII DE JUNHO - XII DE SETEMBRO DE MCMXXXIX A VIAGEM DO CHEFE DO ESTADO ÀS TERRAS DO IMPÉRIO EM ÁFRICA ESTÁ NA MESMA DIRECTRIZ DAS NOSSAS PREOCUPAÇÕES E FINALIDADE, É MANIFESTAÇÃO DO MESMO ESPÍRITO QUE PÔS DE PÉ O ACTO COLONIAL SALAZAR O regresso de Carmona, em Setembro de 1939, seria obscurecido pelos ventos que já sopravam da Europa: começara a Segunda Guerra Mundial. Mas, para Portugal, as memórias dessas duas viagem seriam guardadas para sempre naquela entrada simbólica de Lisboa. Entretanto, os anos passaram e os estadistas morreram. O Império perdeu-se, o regime mudou, outros estadistas apareceram, outro povo surgiu, houve obras no Terreiro do Paço, mas as colunas com as incrições sobreviveram até aos nossos dias. Penso que, devido ao respeito que a História merece - idependentemente da ideologia -, as colunas deveriam ser restauradas de forma a ser mais perceptível a mensagem dos dois estadistas. Agora, se deveriam permanecer ou não no mesmo local, isso é outra discussão. Não me escandalizaria, por exemplo, que as colunas fossem colocadas num museu municipal e substituídas por novas colunas, com outras mensagens. Isso iria dignificar o local, constituindo assim um atractivo extra para os inúmeros turistas que todos os dias visitam o renovado Terreiro do Paço. Caso esta última ideia possa ser adoptada, proponho que as novas colunas contenham poemas de "A Mensagem" de Fernando Pessoa. Quais? Há dois que seriam bastantes apropriados para substituir os actuais: "O Infante" Deus quer, o homem sonha, a obra nasce. Deus quis que a terra fosse toda uma, Que o mar unisse, já não separasse. Sagrou-te, e foste desvendando a espuma, E a orla branca foi de ilha em continente, Clareou, correndo, até ao fim do mundo, E viu-se a terra inteira, de repente, Surgir, redonda, do azul profundo. Quem te sagrou criou-te português. Do mar e nós em ti nos deu sinal. Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez. Senhor, falta cumprir-se Portugal! "Mar Português" Ó mar salgado, quanto do teu sal São lágrimas de Portugal! Por te cruzarmos, quantas mães choraram, Quantos filhos em vão rezaram! Quantas noivas ficaram por casar Para que fosses nosso, ó mar! Valeu a pena? Tudo vale a pena Se a alma não é pequena. Quem quere passar além do Bojador Tem que passar além da dor. Deus ao mar o perigo e o abismo deu, Mas nele é que espelhou o céu. PESSOA

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20120612

Quando o "Expresso" noticiava a ida de Balsemão aos encontros Bilderberg

20120606

Como fazer uma investigação secreta...

Em 2003, o então director do "Expresso", José António Saraiva, actual director do "Sol", publicou este livro de memórias... Na página 203, divulgou como e quando Pinto Balsemão conheceu Emídio Rangel, o futuro director da sua televisão privada, SIC. Saraiva, apesar de não mencionar a data em concreto em que esta história se terá passado, forneceu, no entanto, informações necessárias para establecer com exactidão o dia da semana, mês, ano e até as horas em que tudo aconteceu. Repare-se como é extremamente fácil lá chegar: "Em fins de 1988", começou por dizer, establecendo um período de tempo que podemos calcular como sendo aproximado entre os meses de Outubro a Dezembro. Depois, acrescentou o detalhe que foi durante a "segunda edição do 'Prémio Pessoa'", o que acabou por limitar a data para o mês de Novembro de 1988, altura em que o poeta António Ramos Rosa ganhou o "Prémio Pessoa". Afirma Saraiva que esteve no jantar que antecede a reunião do júri e que "se realiza sempre na noite de quarta-feira, reunindo o júri já durante todo o dia de quinta". Através de uma consulta aos arquivos do "Expresso" - em consulta livre na Hemeroteca de Lisboa - podemos comprovar que o "Prémio Pessoa" de 1988 foi anunciado na manhã de sexta-feira, dia 11 de Novembro de 1988, cuja notícia seria publicada no "Expresso" do dia seguinte, sábado, 12 de Novembro... Portanto, qualquer pessoa poderá ser perfeitamente capaz de establecer, de uma forma legal, que, na noite de quarta-feira, dia 9 de Novembro de 1988, durante um jantar em Seteais, Pinto Balsemão terá pedido ao director do "Expresso" que evitasse a publicação de uma notícia sobre si no "Tal&Qual" dessa semana. No dia seguinte a este pedido, na quinta-feira, dia 10 de Novembro de 1988, o grande arquitecto Saraiva reuniu-se com Emídio Rangel, à hora do almoço, no restaurante "Pabe", ao lado da então sede do "Expresso", na rua Duque de Palmela. Depois dessa reunião, Emídio Rangel terá contactado a direcção do "Tal&Qual" que, em Novembro de 1988, funcionava ali perto, na rua Rodrigo da Fonseca, conforme está registado na ficha técnica da edição publicada no dia seguinte, sexta-feira, 11 de Novembro de 1988... E, depois de ler toda a edição, confirmo que o nome de Pinto Balsemão não foi publicado em nenhuma notícia.

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