20031130

Chove em Lisboa

Não tenho nenhum "furo" jornalístico para dar...
Hoje choveu em Lisboa e fui ver o filme "Os Imortais". O Nicolau Breyner está óptimo (nada comparado com o que se vê na televisão...) e o Rui Unas é uma agradável surpresa.
Foi um dia sem conspirações, mas recomendo um outro filme português: no próximo dia 4, o "Público" vai colocar à venda o DVD do "Camarate", de Luís Filipe Rocha. A Maria João Luís está muito bem e vale a pena comprar, ver, guardar e recordar.

20031129

No Cabaret...

... da Coxa. Acabei de lá chegar onde pude falar sobre o que sei. Só queria dar aqui um abraço ao Rui Unas, que agora também já sabe.
E você? Já sabe?

20031128

Para que se saiba

Esta foi a notícia que a agência estatal portuguesa LUSA colocou em linha às 9h19 do passado dia 20:

"O jornalista Frederico Carvalho lança hoje um livro em que sustenta que a moção de censura apresentada em 1987 pelo PRD contra o primeiro governo de Cavaco Silva serviu para impedir a investigação do caso 'Irãogate' pelo Parlamento.
Frederico Carvalho, jornalista do semanário Tal e Qual, recorda no livro que poucos dias antes da votação da moção de censura o Parlamento aprovou, em 31 de Março de 1987, uma proposta do PCP para a criação de uma comissão de inquérito àquele caso.
Segundo a comunicação social portuguesa e internacional da época, Portugal serviu de 'plataforma giratória', entre 1983 e 1985, para o tráfico de armas entre vários países.
De acordo com as notícias de então, esse tráfico, coordenado pelos Estados Unidos, teria permitido a venda ilegal de armas para os 'Contra' (guerrilha que se opunha ao governo nicaraguense de então), Irão e Iraque (que se encontravam em guerra).
O jornalista recorda no livro 'Eu sei que você sabe - manual de instruções para teorias da conspiração', que após as eleições legislativas o novo parlamento nunca mais votou (como teria de fazer) a criação da nova comissão de inquérito sobre o assunto, deixando-a 'cair' no esquecimento.
Esta situação, considera Frederico Carvalho, condiciona ainda hoje a vida política portuguesa, não só porque se deve a ela o surgimento do esquema de alternância política em vigor (até então os governos obedeciam a coligações que hoje nos pareceriam estranhas, como o Bloco Central, que reuniu socialistas e social-democratas, ou que juntava PS e CDS).
Graças a um trabalho de investigação jornalística, recorrendo a actas da Assembleia da República referentes àquele período, artigos de jornal e livros publicados por intervenientes na vida política de então e dos anos do Bloco Central, Frederico Carvalho procurou, nas suas palavras, 'montar o puzzle' de factos conhecidos mas entretanto esquecidos.
Segundo o jornalista, Mário Soares, primeiro-ministro no Bloco Central e Presidente da República aquando da moção de censura apresentada pelo PRD, e Cavaco Silva, líder do Governo no momento da moção, 'ficaram indelevelmente ligados a esse inquérito parlamentar e um ao outro' (...)."

Parte deste texto foi reproduzido nesse mesmo dia no site da RTP, às 9h30. No fim do Jornal da Tarde desse dia 20 (por volta das 14h20), passou uma reportagem sobre o livro, que foi gravada no Porto. Porém, nessa noite, no Telejornal da televisão do Estado, a notícia já não foi dada.
Repito: Não há censura em Portugal, há "critérios jornalísticos".

20031126

Critérios

Posso dizer, com conhecimento de causa, que hoje, em Portugal, quase 30 anos depois do 25 de Abril, não há censura na Imprensa. Não há lápis azul, não existem militares em gabinetes que fazem a censura prévia.
Em contrapartida, temos uma coisa que se chama "critério jornalístico".

20031124

O Guerra e Pas lançou o seguinte apelo:

"Preciso da ajuda dos nascidos entre 1968-1972 - ou de outros desde que saibam.
Na nossa fase de criança de rua havia uma expressão idiomática, um estribilho, com rima e tudo que usávamos sempre que alguém tinha qualquer guloseima e nós queríamos que ele partilhasse.
Era qualquer coisa como "quem não partilha não...", dito muito depressa a tal frase tinha um efeito invulgarmente poderoso porque obrigava o pobre dono dos Sugus ou das Chicletes à partilha em nome do tal código de rua".

Nasci em 1972, mas não me recordo de nada do género. O melhor que consigo lembrar-me era aquela do "Vou chamar o meu irmão mais velho", ou "Olha que o meu pai é polícia!".
Mas, caso a palavra "partilha" fizesse mesmo parte do dito, então creio que, dentro de uma lógica de rima, até poderia ser uma coisa mais ou menos assim:

"Quem não partilha, leva uma pastilha!"

Ou, porque não:

"Quem não partilha, perde a pastilha!"

Este é o meu singelo contributo... boa sorte pá!

O fugitivo

Para desanuviar um pouco, conheçam aqui a história do doutor Sam Sheppard, o homem que deu origem à série de televisão "O Fugitivo".

20031121

Deliberação

Para que se saiba, aqui fica a cópia de um e-mail que recebi hoje:

DELIBERAÇÃO
sobre
DENÚNCIA APRESENTADA POR FREDERICO DUARTE CARVALHO
CONTRA O JORNAL “EXPRESSO” POR ALEGADO ABUSO DE LIBERDADE DE IMPRENSA


(Aprovada em reunião plenária de 19 de Novembro de 2003)


1. A DENÚNCIA

1.1 No dia 4 de Setembro de 2003 foi recebido e-mail de Frederico Teixeira de Carvalho, jornalista do “Tal & Qual” no qual se refere designadamente o seguinte:

“No passado sábado, dia 30 de Agosto, no espaço ‘Política à Portuguesa’, o director do semanário ‘Expresso’, José António Saraiva, assina um texto de opinião intitulado ‘Lágrimas de Crocodilo’, relacionado com a morte do representante da ONU em Bagdad, Sérgio Vieira de Mello.

A dada altura do seu texto, o autor menciona a questão das armas de destruição maciça e diz que isso foi apenas uma ‘razão formal’ para a intervenção norte-americana no Iraque depois dos atentados terroristas do 11 de Setembro em Nova Iorque e em Washington.

E exemplifica isso desta forma:

‘Imagine o leitor que vivia num sítio problemático, perto de um reduto de marginais, que um dia lhe assaltavam a casa, matando um membro da família.
O que faria, se tivesse meios para combater os marginais: ficaria à espera de ser de novo assaltado ou iria ao encontro deles, tentando neutralizá-los?’
Tratando-se de um jornal de referência e sendo um artigo de opinião assinado pelo próprio director, vemos que o mesmo procurou justificar a intervenção norte-americana no Iraque – que não contou com o aval da ONU – comparando-a a um hipotético caso que se poderia passar no seio de uma qualquer família portuguesa que ‘tivesse meios para combater os marginais’”.

Conclui citando os preceitos dos artigos 298º e 330º do Código Penal, respectivamente sobre a “apologia pública do crime” e o “incitamento à desobediência colectiva” que considera aplicáveis à situação e submete o caso à consideração desta Alta Autoridade como entidade competente para garantir a liberdade de imprensa e reprimir os seus abusos.

1.2 Solicitado ao autor do editorial, director do jornal “Expresso”, José António Saraiva, e nessa qualidade, que se pronunciasse, querendo, sobre o teor da denúncia, respondeu o mesmo dizendo textualmente:
“Com o devido respeito pelo órgão que V.Exª dirige, a queixa apresentada contra mim parece-me ridícula e absolutamente despropositada. Não percebo mesmo como a AACS a considerou razoável.

No meu artigo não ‘recompenso’ ou ‘louvo’ alguém que cometeu um crime. Nem incito à ‘desobediência de lei’ ou de ‘ordem pública’. Limito-me a comparar a acção dos EUA no Iraque com a de uma família a quem mataram um parente e procura ‘neutralizar’ os criminosos.

É esta, exactamente, a palavra que utilizo: neutralizar. Ou seja: evitar que cometam outro crime.

Quanto muito, eu poderia ser acusado de avalizar a ideia de que, em determinadas circunstâncias, é legítimo fazer justiça pelas próprias mãos. Mas, mesmo aí, toda a gente conhece as minhas opiniões e sabe como tenho defendido a necessidade absoluta de respeitar as regras do Estado de Direito.

Repito: o que pretendi, na passagem do artigo em questão, foi levar os leitores a compreender o estado de espírito dos americanos, comparável ao de uma família a quem mataram um membro e que, em desespero, procura defender-se indo ao encontro dos criminosos para impedir novos ataques”.


2. O TEXTO EM CAUSA

2.1 No texto em causa, e no que interessa à questão suscitada pelo denunciante, o Director do jornal “Expresso”, sob o título “Lágrimas de Crocodilo”, afirmou:

“A esquerda não invocou a morte de Sérgio Vieira de Mello por razões piedosas – agitou-a como bandeira para condenar a ocupação americana.
Nesta medida – e dito cruamente – esta morte até conveio a essa esquerda.
Por isso, muitas das lágrimas que chorou foram lágrimas de crocodilo.
A invasão do Iraque pelos americanos tem sido objecto de quilómetros de prosa que, no entanto, ignoram quase sempre o essencial.
Discutem-se interminavelmente, por exemplo, as armas de destruição maciça.
Ora não tenho muitas dúvidas de que, nesta questão, Bush e Blair mentiram – ou, pelo menos, empolaram intencionalmente as informações disponíveis.
Mas esse foi apenas o pretexto para a invasão.
A sua ‘razão formal’.
A questão essencial teve (e continua a ter) que ver com o terrorismo.
Imagine o leitor que vivia num sítio problemático, perto de um reduto de marginais que um dia lhe assaltavam a casa, matando um membro da família.
O que faria, se tivesse meios para combater os marginais: ficaria à espera de ser de novo assaltado ou iria ao encontro deles, tentando neutralizá-los?
Foi isto – com uma simplicidade que é a sua fraqueza e a sua força – que os EUA fizeram: atacados brutalmente no 11 de Setembro, foram dar luta aos terroristas no seu terreno.”

2.2 O que é questionado é saber se, num artigo de opinião, e independentemente da liberdade de imprensa que a Constituição e a Lei asseguram e esta Alta Autoridade é suposta garantir, se não estará perante um excesso que a mesma Lei impede e condena.

E, isso, na medida em que, por raciocínio comparativo, se equiparam no texto em causa, os EUA a um vulgar cidadão, acossado, na sua própria casa, por um bando de marginais – os iraquianos – na expectativa de ser assaltado.

Isto mesmo que os marginais não tivessem armas de fogo, mas ameaçassem atacar apenas com as suas mãos e de surpresa.

Nesta situação, e alegadamente, o articulista, Director do “Expresso”, no seu editorial, interroga-se:

“O que fazia, se tivesse meios para combater os marginais: ficaria à espera de ser de novo atacado ou iria ao encontro deles, tentando neutralizá-los?”

Ou seja, responderia à força com a força, ou recorreria antes à Polícia para que detivesse os suspeitos?

Tiraria desforço indiscriminadamente contra quem quer que fosse, que lhe parecesse suspeito ou entregaria a resolução do caso à Justiça para que julgasse e condenasse os culpados?

Nestas hipóteses, que o Director do “Expresso” enuncia, a sua opção, para justificar a acção dos EUA, foi a da resposta pela força, em vez do recurso aos meios legais e à intervenção da Justiça para julgar os culpados.

Será lícita uma tal afirmação, no contexto em que foi tornada pública pelo escrito?


3. APRECIAÇÃO DA SITUAÇÃO À LUZ DO DIREITO APLICÁVEL

3.1 A Constituição, no seu artigo 37º dispõe:

“1. Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações.

2. O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura.

3. As infracções cometidas no exercício destes direitos ficam submetidas aos princípios gerais de direito criminal, sendo a sua apreciação da competência dos tribunais judiciais”.

E o artigo 38º acrescenta

“1. É garantida a liberdade de imprensa.
2. A liberdade de imprensa implica:
a) A liberdade de expressão e criação dos jornalistas e colaboradores literários, bem como a intervenção dos primeiros na orientação editorial dos respectivos órgãos de comunicação social quando pertencerem ao Estado ou tiverem natureza doutrinária ou confessional;
(...)”
Por seu turno, o artigo 39º atribui a esta Alta Autoridade a incumbência de “assegurar a liberdade de imprensa... bem como a possibilidade de expressão e confronto das diversas correntes de opinião”.

3.2 Por seu turno, a Lei de Imprensa especifica que

“a liberdade de imprensa tem como únicos limites os que decorrem da Constituição e da lei de forma a (...) defender o interesse público e a ordem democrática”.

E, no seu artigo 22º, é garantida aos jornalistas a “liberdade de expressão e de criação”, cujo conteúdo é definido no Estatuto do Jornalista nos termos do seu artigo 7º nº1, sem prejuízo do cumprimento dos deveres constantes do seu artigo 14º e do respectivo Código Deontológico, do qual se ressalta a obrigação de relatar os factos com rigor e exactidão e interpretá-los com honestidade, para além de dever respeitar a orientação e os objectivos definidos no estatuto editorial do órgão de comunicação para que trabalham.

3.3 Entre as óbvias limitações à liberdade de imprensa, por constituir violação dos princípios de interesse e ordem públicas fundadores da ordem democrática, estão as práticas que se possam subsumir como violação dos preceitos dos artigos 20º e 24º da Constituição ou dos artigos 234º, 239º nº2, 240º nº2, 252º, 297º, 298º, 314º, 316º, 326º e 330º do Código Penal.

3.4 Será do confronto do estabelecido nestes preceitos e à luz dos normativo deles decorrente que se impõe apreciar e analisar o escrito publicado pelo Director do “Expresso”.

Ora dúvidas legítimas não são possíveis quanto à inteira liberdade do articulista, mesmo na qualidade de Director do semanário, para exprimir as suas opiniões favoráveis à intervenção armada norte-americana no Iraque.

Acontece, porém, que, para justificar tal invasão, mesmo sem a comprovação da existência de armas de destruição maciça que poriam em risco a paz mundial, o Director do “Expresso” usa uma comparação relativa à idêntica legitimidade que teria um cidadão individual, alegadamente ameaçado, por um bando de marginais (p.ex. ciganos, drogados ou outros grupos considerados não inseridos na sociedade) para, pelas suas próprias mãos, e com os meios armados que possuísse, os dizimar, antecipando-se, assim, à concretização de um hipotético assalto à sua residência.

Será legítima esta metáfora?

3.5 Como figura de retórica, o menos que se poderá dizer é que a mesma não corresponde aos critérios reconhecidos como adequados à sua utilização.

Foi de Roman Jakobson o principal contributo para determinar o significado das duas espécies de tropos, a metáfora e a metomínia. A metáfora é, para ele, “a substituição de um conceito ao longo do eixo paradigmático, e que está ligado à espécie da série paradigmática, à substituição ‘in absentia’ e à substituição de um conceito semântico por afinidade”(Enciclopédia Einaudi vol. 17, pág. 243).

Posteriormente, certos autores como Umberto Eco, Todorov, Schofer e Rice, desenvolveram e aperfeiçoaram as componentes semântico-lexicais que definem o tropo como “transformação semântica do signo in praesentia para o signo in absentia”.

Ora, à luz destes ensinamentos não pode deixar de se concluir que a metáfora utilizada é pobre e falha dos elementos essenciais para poder servir de base a uma efectiva comparação.

3.6 Mas será que, por desadequada enquanto figura de retórica, ela excede os limites da liberdade de imprensa e é susceptível de constituir ofensa a princípios e a valores fundamentais, como os denunciados de incitamento ou apologia pública de um crime (artigos 297º e 298º do Código Penal), ou incitamento à desobediência civil (artº 330º do Código Penal)?

Julga-se, manifestamente, que não.

Com efeito, para lá de ser particularmente infeliz, a metáfora utilizada pelo Director do “Expresso” no seu escrito não alcança dimensão crítica juridicamente relevante para ser subsumível a quaisquer comportamentos ou condutas consideradas anti-jurídicas.

Ninguém, lendo o escrito em causa, se sentiria legitimado e, menos ainda, impulsionado ou pressionado a armar-se para ir dizimar os marginais do Casal Ventoso, os “pretos” da Musgueira ou os ciganos do Vale do Ave.

Ao contrário, pela própria repulsa que, junto de cidadãos medianamente formados, um tal discurso sempre terá tido, só pode concluir-se que, em vez de justificar a invasão norte americana no Iraque, só a fragilizou, retirando-lhe um dos poucos elementos que ainda poderiam servir-lhe de alicerce legal ao nível do direito internacional público.



4. CONCLUSÃO

Apreciada uma denúncia de Frederico Teixeira Carvalho contra o Director do Jornal “Expresso” por alegado abuso da liberdade de imprensa, por publicação do editorial intitulado “Lágrimas de Crocodilo” no dia 30 de Agosto de 2003, a Alta Autoridade para a Comunicação Social, ao abrigo das competências que lhe confere o artigo 39º da Constituição e a Lei nº 43/98, de 6 de Agosto, independentemente de qualquer apreciação sobre a justeza da posição do editorialista, não considerou que a figura de retórica utilizada pelo mencionado jornalista para fazer apologia da invasão norte americana no Iraque fosse de molde a, pela forma como foi construída, induzir quem quer que seja à prática de qualquer crime, designadamente contra a vida de quem quer que fosse ou à utilização indevida da força para reprimir qualquer tentativa de ofensa a direitos pessoais ou patrimoniais de quem quer que fosse, e, nessa conformidade, deliberou o arquivamento dos autos.

Esta deliberação foi aprovada por unanimidade com votos de Jorge Pegado Liz (Relator), Armando Torres Paulo, Artur Portela, Sebastião Lima Rego, José Garibaldi, João Amaral, Maria de Lurdes Monteiro, Carlos Veiga Pereira e José Manuel Mendes.

Alta Autoridade para a Comunicação Social, 19 de Novembro de 2003



O Presidente



Armando Torres Paulo
Juiz Conselheiro



20031120

Prefácio

Este é o prefácio do livro "Eu Sei Que Você Sabe", da autoria de Joaquim Letria que, com a devida autorização do editor, aqui reproduzo:

Uma atitude
Tem nas suas mãos um livro polémico, excitante e interessante publicado por um jovem jornalista que gosta de ir mais longe e a maior profundidade no porquê dos factos e no seu relacionamento, para melhor perceber a razão de ser das coisas e que, da sua curta existência e da sua ainda breve vida profissional, já retirou a experiência suficiente para saber que muitas coisas nem sempre são o que parecem, que outras não aconteceram acidentalmente, que certos acontecimentos não ocorreram como foram descritos e que raramente as coincidências são obra do acaso.
Tive o prazer, e o privilégio, de dirigir uma jovem equipa de jornalistas que incluía Frederico Duarte Carvalho. E se desses tempos alguma coisa de bom tenho a recordar, uma delas é, sem dúvida, a insatisfação permanente do Frederico, as suas dúvidas, por vezes incómodas, o seu arrojo, que muitos confundiam com descaramento, e a vontade irreprimível de ir sempre mais longe, o desejo de ter informação privilegiada, o profissionalismo com que buscava as fontes e que com elas se relacionava, o anseio de ultrapassar a sua porção da verdade para atingir a quase impossível verdade total.
Percebo, portanto, a motivação de Frederico Duarte Carvalho ao escrever este livro. Compreendo o relacionamento que nele faz entre factos, o cruzamento que permanentemente executa das informações, a inquietação com que põe em causa as verdades sedimentadas de alguns factos importantes que ele próprio, pela sua idade, não viveu plenamente mas a que se deu ao trabalho paciente de investigar .
E é sobretudo isso que fascina no labor sempre activo do Frederico e é isso que atrai neste livro onde há interrogações que os mais crédulos podem alcunhar de especulações jornalísticas e no qual surgem passagens que não são mais do que simples somas de dois mais dois , mas que ninguém ainda concluíra que o resultado final era igual a quatro.
Num momento muito particular da História, e quando emergem novas gerações a quem é ensinado o conformismo, ou que aprendem as vantagens de aceitar o que lhes é dito como verdade inquestionável, é reconfortante encontrar alguém que não se cansa de fazer perguntas, nem se atemoriza a questionar, como Frederico Duarte Carvalho. No fundo, homenageando com esta sua permanente atitude gente que deu a própria vida à verdadeira investigação jornalística, como tributo à liberdade de expressão e à verdade a que todos os cidadãos livres têm direito para uma sociedade mais justa e mais verdadeira.
Este livro de Frederico Duarte Carvalho é uma vénia à memória dos 3180 jornalistas que nos últimos 40 anos deram as suas vidas no mundo inteiro pelo verdadeiro jornalismo e pela liberdade de expressão.
Por esta mesma atitude que Frederico de Carvalho adoptou, Mino Pecorelli apareceu com a cabeça estourada a tiro à porta de sua casa donde saíra com uma história das ligações duvidosas de Giulio Andreotti; desapareceu o francês Alain Joffrainne quando no Panamá investigava as ligações do narcotráfico às contas de Noriega na Suiça, Luxemburgo, Liechenstein e Mónaco; foi encontrado degolado, no quarto dum hotel de Varsóvia, o corpo do austríaco Paul Noverker, que seguia a rota secreta do plutónio; foi descoberto, cravado cruelmente a uma porta o corpo decapitado do canadiano John Larrimore que, em 1993, sabia demais acerca do tráfico de armas para os Balcãs ; e foi cravado de balas o irlandês Sean O’Flarthey que na América seguia o percurso secreto das armas para o IRA.
É como um tributo a essas e tantas outras memórias que tomo este livro, certo de que muito se irá escrever sobre ele e antecipadamente ciente que não poderá ser indiferente a ninguém. Muitos detestá-lo-ão, muitos outros o apreciarão. Mas todos, seguramente, o vão ler.
Joaquim Letria
Setembro de 2003

Intervalo

Faço aqui um intervalo na divulgação do meu livro "Eu Sei Que Você Sabe - Manual de Instruções para Teorias da Conspiração" e dar conta de um outro livro que também chegou esta semana às livrarias. E que estou agora a ler.
Chama-se "No Dia Em Que Fugimos Tu Não Estavas em Casa", do Fernando Alvim.
Ele pode gostar de ser conhecido na televisão como "Perfeito Anormal", mas este livro é diferente. É lindo. É apaixonado, é cruel, e é bem escrito. Como muitas vezes eu gostaria de escrever.
Só tenho uma dúvida: como é que ele, que nunca leu Corto Maltese, consegue ter tanta sensibilidade?

20031118

"Eu Sei Que Você Sabe - Manual de Instruções para Teorias da Conspiração", é este o título do meu próximo livro.
Vai chegar às livrarias na quinta-feira, dia 20. É publicado pelas "Edições Polvo", com prefácio de Joaquim Letria e tem lá as respostas a estas perguntas:

- Onde estava o embaixador norte-americano no dia 25 de Abril de 1974?
- A CIA foi realmente apanhada a dormir no dia da Revolução dos Cravos?
- O que veio Henry Kissinger fazer a Portugal quinze dias antes da morte de Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa?
- Portugal vendeu armas para o Irão quando havia um embargo?
- Afinal, Mota Pinto morreu de ataque de coração antes ou depois de Freitas do Amaral ter anunciado a sua candidatura à Presidência da República?
- Cavaco Silva conspirou para vencer o congresso da Figueira da Foz?
- Um inquérito parlamentar sobre o tráfico de armas de Portugal para a Nicarágua, no âmbito do escândalo “Irangate”, foi aprovada na Assembleia da República, mas nunca avançou. Porquê?
- Haverá alguma relação entre esse inquérito e a dissolução da Assembleia da República decretada por Mário Soares, e que permitiu a Cavaco Silva conquistar a sua primeira maioria absoluta?
- Será que Durão Barroso, em menos de 19 horas, viajou num avião supersónico até aos EUA, negociou secretamente a posição de Portugal na invasão do Iraque, e voltou?
- Que coincidências existem entre Carlos Cruz e os poderosos da política no caso de pedofilia na Casa Pia?

20031117

Manual II

"Eu Sei Que Você Sabe - Manual de Instruções para Teorias da Conspiração", é este o título do meu próximo livro.
Vai chegar às livrarias nesta quinta-feira, dia 20.
Abordará temas como o 25 de Abril, a participação de políticos portugueses nas reuniões secretas do grupo de Bilderberg, Camarate e ainda o papel de Portugal, e dos nossos políticos, no escândalo da venda ilegal de armas norte-americanas durante a guerra Irão-Iraque, que ficou conhecido como "Irangate" ou "Irão-Contra". E ainda o recente caso da Casa Pia.
Tem prefácio de Joaquim Letria e é publicado pelas "Edições Polvo", uma editora que, até agora, publicou maioritariamente Banda Desenhada portuguesa.

20031116

Manual

"Eu Sei Que Você Sabe - Manual de Instruções para Teorias da Conspiração", é este o título do meu próximo livro.

20031115

Jornalistas de guerra

Agora que a jornalista Maria João Ruela vem a caminho de Portugal e Carlos Raleiras já foi resgatado, quero aqui mandar-lhes um abraço de solidariedade.
Tenho uma certa admiração pelos repórteres que vão para o campo nos momentos mais perigosos.
Conheci um assim, há um ano, quando estive na Venezuela e cheguei a Caracas no dia em que havia uma marcha popular até ao Conselho Nacional de Eleições, para entregar as assinaturas a pedir um referendo contra o presidente Hugo Chávez.
Aleixo, jornalista português radicado na Venezuela, era o meu contacto. Não o conhecia pessoalmente, mas assim que lhe telefonei para o telemóvel, ele deu-me instruções para me juntar a si na cabeça da marcha. Chegamos a um cruzamento e a polícia impediu a marcha de seguir, pois havia resistentes chavistas mais à frente e não podiam garantir a nossa segurança.
No ar sentia-se o gás lacrimogéneo e Aleixo aconselhou-me a colocar vinagre na cara para evitar os efeitos. E avançava, enquanto que eu, atrás dele, perguntava-me "Mas para quê? Para quê?".
"Da última vez, eles disparam contra nós neste ponto", disse-me Aleixo, pelo que me lembrei dos acontecimentos do 11 de Abril de 2002, onde morreram pessoas naquele tipo de confrontos.
As balas, neste caso, podiam vir de qualquer lado e nós estavamos mais do que expostos no meio da rua.
Havia jornalistas com máscaras de gás. O Aleixo não tinha nada disso e muito menos possuía um colete à prova de bala (eu também não, mas apenas porque ainda não me tinha apercebido da imprudência).
Aleixo tirava fotografias a jornalistas que tiravam fotografias protegidos com coletes à prova de bala e máscaras de gás, enquanto eu tirava fotografias a ele a tirar fotografias...
Até que rebentou uma bomba de gás à minha frente. Saí a correr pela via mais próxima e só parei dentro de um restaurante português, e vi o resto da manifestação pela televisão, enquanto comia uma dobrada à moda do Porto (já não comia uma em Portugal há muito tempo).
Não me considero cobarde, não senhor. Houve um jornalista nesse dia que apanhou com um tiro em cheio no peito. Só não morrer porque levava colete à prova de bala.
Acho que, no que a mim me toca, não vale a pena andar assim exposto, a tirar fotos a quem tem pistolas na mão e que dispara tiros a torto e direito, quando acho que já é igualmente perigoso (e provavelmente até menos (re)conhecido publicamente) andar a investigar quem fornece as armas e as balas que depois alimentam estes e outros conflitos mundiais...

20031114

Ferro e Bilderberg

Na "Visão" de ontem, entrevista a Ferro Rodrigues, o líder do PS diz a certa altura que "houve muito pouca gente a saber, entre os dias 12 e 21 [de Maio, vésperas da detenção de Paulo Pedroso], o que estava em marcha. Mas nós só fizemos aquilo que a nossa consciência nos obrigava a fazer. No meio deste processo tão difícil, estive numa reunião em Versalhes, como convidado daqueles encontros de Bildberg, durante dois dias, sempre com o telemóvel de prevenção para falar com o Paulo Pedroso e, claro, com o António Costa".
Os encontros de Bilderberg (e não Bildberg, como erradamente apareceu na revista), são encontros anuais, com características secretas, organizados entre políticos e grandes magnatas.
Tais encontros não permitem a presença de jornalistas, pelo que pouco se conhece do teor das conversas. Aliás, muita gente interroga-se sobre o que realmente é ali "cozinhado", visto que, se é supostamente bom para todos nós, então porque não publicitam e estimulam este género de reuniões?!
É, por isso, interessante notar a menção de Ferro Rodrigues a este encontro secreto em particular. Ainda por cima, quando surge na sequência de uma afirmação de que "muito pouca gente sabia" do que se estaria a passar em relação à Casa Pia e ao envolvimento do seu nome e do de Paulo Pedroso.
Será que os outros portugueses que também estiveram em Versalhes naqueles dois dias falaram disso com Ferro?
Será que ele desbafou os seus problemas com os portugueses que encontrou por lá?
Será que depois falou desse "desabafo" ao telefone com António Costa e isso está nas escutas ao seu telefone?
Como então explicar esta menção a Bilderberg, que Ferro Rodrigues fez questão em publicitar, ao arrepio de todas as normas de secretismo que se escondem por detrás daquela organização mundial?
Será isto um "aviso" para alguém?
E, já agora, quem foram os outros portugueses referenciados nesse encontro de Bilderberg de 2003?
Esta última é fácil de responder. Vejam aqui.

11 de Setembro, o filme

Estreou finalmente em Portugal (já tenho do DVD há quase seis meses!) o filme "11'9''01".
Aconselho em especial a história do britânico Ken Loach, pela maneira como organizou um documentário que compara o 11 de Setembro de 1973 no Chile com o 11 de Setembro mais recente.
Chamo a atenção para o humor final na história do africano Idrissa Ouedraogo: "Volta bin Laden, precisamos de ti..."
Destaco a interpretação de Ernest Borgnine na corajosa alegoria idealizada pelo americano Sean Penn.
Fico sem palavras para descrever o trabalho do mexicano Alejandro González Iñárritu (no meio daquelas vozes de rádio há lá sons da nossa RDP...).

20031113

O atentado que não houve...

Faltam pouco menos de cinco horas para o dia acabar e não houve houve hoje qualquer atentado.
Escrevi aqui há algum tempo que, de acordo com a lógica matemática depois do 11-9-2001, em Nova Iorque, e do 12-10-2002, em Bali, deveria ter havido hoje, 13-11-2003, um grande atentado da al-Qaeda num qualquer local do globo.
Inlusive, lancei até algumas hipóteses de quais os países que poderiam vir a ser prováveis alvos.
Espanha e Itália eram os dois primeiros nomes da minha lista.
Acho que, como não houve nenhum atentado hoje, posso dizer que me sinto contente porque salvei vidas...
Pensem: não teria sido mais terrível para nós, portugueses, se o atentado de ontem contra o contigente italiano de Nassíria (por coincidência, um ano e um mês depois de Bali) tivesse coincidido com a chegada dos nossos homens da GNR àquela localidade?
De qualquer modo, agradeço aqui ao Didi o facto de também ter partilhado a sua preocupação...
Saúde!

"Colaborador"

Tem-se vindo, pouco a pouco, a assistir ao desaparecimento da palavra "trabalhador", que começa cada vez mais a ser substituída por "colaborador".
Hoje, até parece que já não existem "trabalhadores", pois todos nós, afinal, andamos é a "colaborar" para uma obra comum.
Ora, se já não há o "trabalhador", será que também faz sentido existir um "patrão" ou "chefe"?
O que se chamará ao superior hierárquico de um "colaborador"?
Será que não poderíamos chamar-lhe "mestre", ou "mentor"?
Nos jornais, é sabido, o colaborador é aquele que não pertence aos quadros da redacção, logo, eu NÃO SOU "colaborador".
Quanto muito, posso até ser considerado por alguns como um tipo que é um bocado "colaboracionista"...

20031112

Militares no Iraque...

Vejam aqui, no site do Washington Post, as fotos de alguns dos soldados norte-americanos que já morreram no Iraque.

20031111

Golpe de Estádio

O título deste "post" foi "emprestado" de um livro do jornalista Marinho Neves.
Este jornalista escreveu em 1993 um romance sobre os bastidores do mundo do futebol, onde falava de um presidente de um clube no Norte que tinha o sonho de ter um estádio com o seu nome. Era o João Samaritano...
No próximo domingo (não nada a ver, mas é também o dia de anos de José Saramago), o FC Porto vai inaugurar o "Estádio do Dragão".
Acho, muito particularmente, que o nome deste estádio vai ser um dia modificado para "Estádio Pinto da Costa".
Reparem que sempre é mais fácil convencer os sócios a mudar "Dragão" para "Pinto da Costa", do que se, por exemplo, tivesse o nome "José Maria Pedroto", uma referência que muitos adeptos do bom futebol portista gostariam de ter visto...
Quanto à polémica sobre as presenças, ou melhor, as ausências, de certas figuras públicas na inauguração só tenho a dizer o seguinte: é precisamente por causa destas polémicas que o FC Porto é um clube único. Eu até torço pelo Porto quando joga no estrangeiro. E faço isso porque sei que há portistas que não o fazem quando o meu Boavista ou o Benfica e o Sporting jogam lá fora... Porém, mais vale estar calado em relação a certas coisas, pois ainda vou ao Porto de vez em quando...
Sou portuense, mas não sou portista.
You know what I mean?!

Ibéricos

Graças ao Ser Português descobri que Portugal já é uma província de Espanha. Contudo, noto que ainda existe um sentimento envergonhado, onde no mapa as zonas lusitanas dessa grande Ibéria ainda estão num tom cinzento mais escuro em relação às nossas províncias "hermanas"
Alguém tem de dizer à Cepsa que isso deveria ser corrigido...

Maneiras de ver

Sem qualquer comentário, segue aqui a crónica de hoje de Joaquim Letria no diário "24horas":

Os jornalistas portugueses que acompanharam Durão Barroso a Angola rejubilaram com a descoberta de parentes entre a comunidade portuguesa e deslumbraram-se com o folclore protocolar.
Os brasileiros que foram com Lula, uma semana depois, foram derrotados pela miséria infra-humana dos 15 quilómetros que separam o hotel de luxo onde pernoitaram e o Bairro Casenga, "percurso entre lixões fétidos e esgotos a céu aberto, como numa interminável vitrina de horror, homens, mulheres e crianças andavam sobre latas, garrafas, panos, caixas e restos de comida" (...). "Para colorir o ambiente, as cadeirinhas de cores variadas que as crianças levam para a escola. Não há cadeiras nem mesas nas salas de aula de Luanda".
Outros comentaram: "Numa situação assim, a saúde é dos mais graves problemas de Angola, (...) que numa ironia cruel tem petróleo e diamantes (...) 28 anos depois da festa da independência e 24 depois da posse de actual Presidente, José Eduardo dos Santos, o mesmo que chegou ao poder aliado ao bloco soviético".
Não admira que o jornalismo agonize nas Universidades portuguesas e no Brasil seja licenciatura pujante e popular.

20031110

Flavienses

"Quem Quer Ser Milionário", esta noite, na RTP.
Uma senhora formada em letras (disse que queria ser tradutora) pediu ajuda ao público para responder à pergunta: "Que nome se dá aos habitantes de Chaves?". Ela ainda esteve indecisa entre "Clavienses" e "Chavenses".
O público ajudou-a ao votar com 60 por cento a opção "Flavienses".
De notar ainda que uma quarta hipótese, "Chaveiros", teve 6 por cento da votação do público. Mas calculo que tenham sido uns brincalhões que se lembraram de fazer isso.
Mais à frente, a mesma senhora formada em letras disse que o Alexandre Dumas (pai) não escreveu "Os Três Mosqueteiros", e continuou em frente quando Jorge Gabriel sugeriu que utilizasse a ajuda dos 50-50.
E depois de ter dito que S. Tomé é a capital de S. Tomé e Prí­ncipe, ganhou 10 mil euros...
Vá lá que depois a senhora até sabia que entre Sipke Lee, Steven Spielberg e Coppola, foi Oliver Stone quem fez recentemente um documentário sobre Fidel Castro (já vi a banda sonora à venda na FNAC, mas ainda não há filme nas nossas salas... Pena.) Já levava 16 mil euros...
Depois de quase ter sido levada "ao colo", eis que chegou a 12ª pergunta das 15 do jogo.
A pergunta era "Quem representou o Papa na inauguração de Brasília". As hipóteses eram "Cardeal Cerejeira", "Cardeal D. António Ribeiro", "D. António Ferreira Gomes" e "Bispo de S. Paulo".
Pediu então ajuda telefónica ao pai, que lhe disse que talvez tivesse sido D. António Ferreira Gomes, por ser da Oposição ao regime e que iria representar o Papa em Brasí­lia...
A senhora ficou ainda a pensar... Arriscaria na opção de Cerejeira, mas poderia perder 6 mil euros caso falhasse.
Escolheu mesmo esta última e ganhou 32 mil euros...
Eis que soou o gongo e amanhã há mais...
Moral: não há moral...

Mórmon, me?!

O jornalista José Alberto Carvalho escreveu hoje no diário "24horas" uma pequena nota sobre a Igreja mórmon, fruto das semanas que esteve a vistar os EUA:

"A Igreja mórmon reivindica possuir o maior arquivo do mundo de informação genealógica. O que encontrei deixou-me entre o choque e a estupefacção: registos de escolas e igrejas portuguesas (e de outros países), incluindo assentos de baptismo e de casamento, desde o século XVII, pelo menos. Quem autorizou?"

O "Tal&Qual" desta última semana também tem um artigo sobre esta Igreja e toda a documentação que eles guardam num abrigo nuclear nos EUA. A pretexto de uma crença religiosa bem intencionada.
A única coisa que eu consigo dizer a este respeito é que ter informação é ter poder.
Ter acesso a toda a informação sobre os nossos antepassados é ter muito poder.
Ter acesso à nossa memória, do outro lado do Oceano, através de um simples toque de botão é ter mesmo muito muito poder.
Agora, a questão é saber como vai ser usado todo esse poder.


Descobri no Bacb certas declarações atribuídas a Paulo Portas e que terão sido publicadas no nº 1 da já extinta revista "Kapa" (edição de Outubro de 1990).
O autor do blogue destacou nas palavras de PP a afirmação desfavorável aos militares. Não vou por aí.
Prefiro descobrir na pureza destas palavras de há mais de 10 anos as razões que o levaram a escolher estar ao lado de Sá Carneiro.
Leiam.

“Lembro-me perfeitamente. Como se fosse hoje. Vasco Gonçalves apareceu na televisão mais despenteado do que nunca. Parecia sentado numa cadeira, mas na verdade deitava-se nela. Fazia gestos brutos e metralhava palavras de irritação geral com o mundo. Havia baba e raiva. Ele coçava-se e a câmara tremia. Punha e tirava os óculos ao compasso dos amores e dos ódios. Era uma cena de pura violência política no Estado à beira do colapso.
Eu tinha onze anos e espantei-me. Desde pequenino ouvia falar de política em casa, vagamente no colégio dos jesuítas, às vezes na missa. O meu pai achava que a vida faria sentido para mudar o mundo, a minha mãe suspeitava que a desordem do mundo podia dar cabo da nossa vida. Como é natural, eu não tinha opiniões, só impressões. Nem sabia de razões, só de emoções. A aparição do companheiro Vasco teve o efeito de me decidir. A imagem dele faz parte da minha memória do mal. Porque há sempre um momento, sei que Vasco Gonçalves teve a maior importância na minha iniciação militante. Se a primeira vez é importante, ele foi a minha primeira vez em política. Podia tê-lo seguido e ficaria do lado de lá da barricada: talvez fosse hoje um desses homens de esquerda que todos os dias matam a sombra, apagam o lastro e gozam o sistema. Mas não. Devo a Vasco Gonçalves o facto de ser uma criatura irremediavelmente de direita. Olhei para ele e fiquei contra-revolucionário. Daí para a frente, passei a desconfiar dos militares e a detestar o comunismo. Quanto aos militares, façam lá o que fizerem as fardas oficiais, quero-os longe. Quanto aos comunistas, levei tempo a digeri-los. Só agora consigo respeitar um camarada disposto a morrer camarada: é um facto mais digno e humanitário do que a massificação da dissidência. Não passou mais do que um mês. O Império desapareceu num ápice e Portugal tornou-se na pequena República de moda para fotógrafos, sociólogos e curiosos barbudos. O socialismo irreal nascia cá, por aqui se praticava o perfeito suicídio ocidental. Direita não havia: o último mito foi o monóculo de Spínola, homem que se celebrizou por ir à televisão anunciar que, estando o país a saque como estava, ia-se embora como foi. A burguesia tratou de salvar os haveres mais secretos e partiu. No dia em que eu fiz doze anos ganhei um direito que já não se usa: podia filiar-me num partido. Fui a correr pedir uma ficha no grémio juvenil dos laranjinhas. Como se fosse um escuteiro de Sá Carneiro. Vi por lá uma fotografia de Marx e trouxe para casa um livrinho de Bernstein. Não gostei do que vi, nem entendi o que li. Estranhei e por momentos hesitei. Mas não havia muitas opções. Atribuo a um conceito de educação nunca ter acreditado numa só palavra que Mário Soares dissesse. Enquanto as tias que sobravam iam de vison posto para os comícios dele – ‘se isto não é o povo, onde está o povo?’, perguntavam elas – eu achava-o leviano como não se pode ser e mentirolas como não se deve ser. Quanto a Freitas do Amaral, era difícil ouvi-lo nesse tempo. As vezes que o ouvi, parecia-me um bispo; e soava-me de menos, porque uma contra-revolução não se faz pedagogicamente. Escolhi Sá Carneiro por uma irracionalidade lúcida; e por exclusão de partes. Devo a Sá Carneiro duas coisas: ser democrata e não gostar de política. Na idade que eu tinha e no estado em que o país estava, a tentação natural era tornar reaccionário. Mas Sá Carneiro, a quem segui sem me interrogar, jogava por fora do sistema e por dentro do regime. Marcou as fronteiras do que a direita portuguesa devia ser sempre e nunca mais foi: não há compromisso com a esquerda do sistema nem há compromisso à direita do regime. Era de uma solidão radical, facto dez vezes preferível ao consenso universal. Tinha sinais naturais de classe e por isso é que não parecia frequentável para a maioria dos amigos e inimigos. Conseguiu uma coligação raríssima: era um homem de dizer o que pensava e ao mesmo tempo era um político de pensar o que dizia. E coincidia. Morreu em campanha mas nunca se mortificou pelo Estado. Nisso, era exemplar. O costume bem conservador e bem possidónio em Portugal é que a política se faz por sacrifício e com sofrimento. Sá Carneiro era um profissional, gostava de jogar e punha tudo em risco. Provou a toda a gente que a direita podia governar Portugal e provou a Portugal que a direita podia ser moderna.
Já passaram muitos anos e Sá Carneiro ainda é a última prova de ambas as teses. Pergunto-me se não foi uma ilusão. Como a águia-real no país dos corvos.”

20031109

Como podia ser Lisboa

Imagens* de Lisbon, Ohio.

*Thanks to A.P.

20031108

Milionários...

"Quem quer ser milionário".
Há pouco, na RTP.
A pergunta era: "Que rainha portuguesa 'escondia pães' no seu regaço?".
As hipóteses eram: D. Maria Pia, Filipa de Lencastre, Santa Isabel e D. Leonor Teles.
O concorrente não sabia e pediu ajuda telefónica.
Um amigo atendeu e, depois de ouvir a pergunta, passou o telemóvel logo à mulher, pelo que o concorrente teve de repetir a questão.
Faltavam 13 segundos...
A senhora respondeu. Sem hesitar. Imediatamente: "Santa Isabel".
O concorrente aceitou a resposta também sem hesitar.
Jorge Gabriel quis saber porque tinha ele tanta certeza, pelo que o concorrente esclareceu: "Ela é professora".
E ganhou 750 euros.
Moral: Meninos, nunca deixem de aprender na escola com os vossos professores. Nunca se sabe quando o conhecimento da nossa História poderá um dia vir a ser-vos útil.
Este concorrente, meninos, caso não tivesse a sorte de conhecer um amigo cuja mulher era professora, teria ficado pelo caminho.
Vejam estes exemplos e aprendam.
Outros, antes de vocês, não o fizeram...

Está tudo bem

Para aqueles que manifestaram a sua preocupação pelo meu silêncio desde quarta-feira (hoje é sábado) , queria dizer que está tudo bem comigo.
Pura e simplesmente senti que não havia nada de novo para escrever.
Sei que, na quinta-feira, houve mais uma reunião da comissão de inquérito parlamentar de Camarate e foi divulgado um relatório "explosivo", e até "histórico", sobre um fundo secreto militar que, alegadamente, Adelino Amaro da Costa andaria a investigar.
É claro que nenhum jovem jornalista, nem nenhum jovem membro da comissão, se lembrou de ir consultar os jornais da altura em que foi extinto o fundo. Em Novembro de 1980.
Se o tivessem feito, teriam constatado que não há nas conclusões do relatório nada de novo...
Por isso, nada me apeteceu dizer.

20031105

Não vou ficar contente...

Também já me perguntaram se ficarei contente caso acerte na previsão de que no próximo dia 13 vai ocorrer um grande atentado a nível mundial (apenas porque fiz notar que existe uma lógica matemática nas datas dos dois anteriores atentados atribuídos aos terroristas de Bin Laden: Nova Iorque a 11-9-2001 e Bali a 12-10-2002, pelo que o próximo será, dentro desta lógica fria, a 13-11-2003.
Não vou ficar nada contente se acertar.
Se nada acontecer, ficarei feliz porque sei que salvei vidas...

Onde vai ser?

Onde é que vai ser o próximo grande atentado? Sim, aquele que a lógica matemática indica que vai ser dentro de uma semana, na próxima quinta-feira.
Temos várias hipóteses:
- Espanha (Portugal está demasiado protegido devido aos Açores)
- Itália
- Reino Unido
- Médio Oriente
- Coreia do Sul
- Austrália
- Malásia
- Tailândia

Enfim, qualquer País que sirva para convencer a comunidade internacional a reforçar a luta contra o terrorismo, e a apoiar o esforço militar norte-americano no Iraque e nos países que se seguIRÃO na lista.

20031104

Portugal não tem serviços secretos

É verdade. Portugal não tem serviços secretos.
Quem o diz é o próprio SIS no endereço da Internet:

"Os 'serviços secretos' são, por definição, aqueles sobre os quais se ignora a sua própria existência. Ora, não é isso que sucede com o SIS, que foi criado por um diploma legal e cuja existência é do conhecimento da generalidade dos cidadãos. Além disso, as suas atribuições e competências encontram-se reguladas por lei e a indigitação do seu Director-Geral é precedida de uma audição parlamentar, com ampla publicidade. E a circunstância de o SIS possuir esta página na Internet afasta, desde logo, a sua caracterização como 'serviço secreto'. O SIS é, isso sim, um serviço que produz e recolhe informações necessárias à segurança interna da República Portuguesa e cujas actividades são consideradas, para todos os efeitos, classificadas e de interesse para a segurança do Estado."

Eu até tenho muita consideração pelo SIS (A sério. E os rapazes que me conhecem lá sabem bem que eu não sou perigoso).
Podem ler no endereço da Net, por exemplo, que a lei proibe o SIS de fazer intercepção de comunicações. Só em casos de terrorismo ou espionagem.
Por isso, aqui fica o meu aviso a todos aqueles que me conhecem no SIS que têm de ter mais atenção a estas coisas porque no "Público" deste último domingo, no artigo sobre um relatório do SIS a propósito da prostituição juvenil no Parque Eduardo VII, vem lá este parágrafo. Foi sobre isto que eu falei ontem ao telefone, no comboio, quando vinha do Porto... Lembram-se?

"O trabalho de campo do SIS envolveu a aquisição de algumas dezenas de telemóveis, posteriormente oferecidos a jovens prostitutos. As chamadas recebidas permitiram elaborar um perfil dos pedófilos. 'Em Portugal', recorda a 'secreta', 'quem procura e paga os 'serviços' são normalmente homens de condição social elevada, frequentemente estrangeiros (sobretudo ingleses, holandeses e franceses), muitos deles já indiciados ou condenados por crimes sexuais nos seus países de origem'."

De resto, já sabem onde é que vai ser o atentado terrorista do próximo dia 13? (Para quem não sabe ainda, existe por aí uma teoria que segue uma lógica matemática. Vale pelo que vale, mas constata-se que tendo ocorrido o atentado de Nova Iorque a 11/9/2001, seguindo-se depois um atentado em Bali a 12/10/2002, a lógica indica que um próximo grande atentado terrorista à escala mundial será a 13/11/2003).

Soares apoiará Cavaco

Alguém resolveu criar um blogue não oficial de apoio à candidatura de António Guterres à Presidência da República.
Mas viu-se logo que tem uma visão um pouco errada do rumo da história e dos acontecimentos. O autor do blog colocou lá, por exemplo, uma notícia do dia 1 de Novembro, onde dizia o seguinte:
"Mário Soares admite perante os microfones da rádio Antena 1 a possibilidade de apoiar uma eventual candidatura presidencial de António Guterres se o objectivo for derrotar um candidato da direita".

A notícia da agência Lusa, reproduzida no "Público" de domingo, dia 2, dizia mais:

Mário Soares Admite Apoiar Guterres para PR Contra Candidato da Direita
Por LUSA
Domingo, 02 de Novembro de 2003

O antigo Chefe de Estado e actual eurodeputado Mário Soares (PS) admitiu ontem a possibilidade de apoiar uma eventual candidatura presidencial de António Guterres se o objectivo for derrotar um candidato da direita.

"Não terei dúvidas em o apoiar se do outro lado estiver uma pessoa de direita, mas também é preciso saber se há outras pessoas", disse Mário Soares à rádio Antena 1, numa entrevista em que elogiou o sentido de Estado de Cavaco Silva, antigo primeiro-ministro do PSD apontado como um dos potenciais candidatos à Presidência da República.

"Um homem de convicções, dele nunca disse que é um homem de direita, tem as características de um social-democrata liberal próximo de Schroeder (chanceler alemão)", declarou Soares, sobre Cavaco Silva. Na análise sobre figuras da vida portuguesa, Soares frisou que o líder do PS, Ferro Rodrigues, "está a ser atacado como nunca aconteceu com nenhum outro dirigente político em Portugal".

Acerca de Guterres salientou que "é muito novo e tem certamente um futuro político pela frente", tendo como primeiro-ministro feito coisas boas e coisas más, mas, no final, "fez muitas más coisas e deixou que isto andasse como andou", pelo que se interrogou sobre "como é que os portugueses o vão desculpar".

....
Estão agora a ver o tipo de "apoio" de Soares?
Soares disse claramente que "Cavaco Silva tem as características de um social-democrata liberal próximo de Schroeder". Logo, se houver uma candidatura de Cavaco Silva, Mário Soares poderá não a apoiar directamente, mas creio que também não o irá criticar como gostaria aquele que vier então a ser escolhido como candidato socialista.
Guterres, como "é muito novo", que espere só um bocadinho. Cavaco, quanto a mim, irá estar em Belém apenas cinco anos. Depois, diz que está cansado e então Guterres poderá medir forças com Santana Lopes.

Palmas para o Jorge

Esta é a letra do "Ai, Portugal, Portugal", do Jorge Palma.
Vale a pena recordar e muita atenção, mesmo muita atenção, à última quadra...

Triste gente de muita coragem
E acreditaste na tua mensagem
Foste ganhando terreno
E foste perdendo a memória

Já tinhas meio mundo na mão
Quiseste impôr a tua religião
E acabaste por perder a tua liberdade
A caminho da glória

(Refrão)
Ai, Portugal, Portugal
De que é que tu estás à espera?
Tens um pé na galera
E outro no fundo do mar
Ai, Portugal, Portugal
Enquanto ficares à espera
Ninguém te pode ajudar

Tiveste muitas cartas para bater
Quem joga deve aprender a perder
Que a sorte nunca vem só
Quando bate à nossa porta

Esbanjaste muita vida nas apostas
E agora trazes o desgosto às costas
Não se pode estar direito
Quando se tem a espinha torta

(Refrão)

Fizeste cego de quem olhos tinha
Quiseste pôr toda a gente na linha
Trocaste a alma e o coração
Pela ponta das tuas lanças

Difamaste quem verdades dizia
Confundiste amor com pornografia
E depois perdeste o gosto
De brincar com as tuas crianças

(Refrão)

20031103

"Quando" volta a ser observado

Já não actualizava aqui há algum tempo uma espécie de rubrica nada fixa e sem qualquer organização que apelidei de "Observatório do Quando".
Para quem não o conhece, informo que se trata de uma ideia que surgiu depois do Joel Neto, do "não esperam nada de mim", ter desabafado sobre o facto dos jornalistas começarem muitas vezes os textos com uma "muleta" que é o "Quando".
Não é que o uso dessa palavra seja errado. Pura e simplesmente é um facilitismo da escrita. Eu próprio já o usei muitas vezes, mas prefiro guardá-lo para uma altura em que se diga: "Agora sim, este texto merece e deve começar com um 'quando'".
A título de exemplo, escrutinei aqui alguns textos de revistas semanais (pois era aí que se notavam com maior impacto os vários exemplos de artigos que começavam com "Quando"). Depois, em Setembro, quando fui de férias, a rubrica também descansou e no regresso acabou mesmo por desaparecer.
No sábado, recebi um e-mail.
Era da Sónia Sapage, da "Visão". Ela tinha um "recorde" no uso do "quando", pois, salvo erro, fora mencionada em duas semanas consecutivas, a ponto de eu até ter escrito que alguém deveria fazer o favor de a avisar.
Com a devida autorização da própria, reproduzo aqui o e-mail que me enviou:

"Caríssimo Frederico Duarte Carvalho...
Não foi preciso um amigo avisar-me (pelos vistos não tenho amigos corajosos). Recebi a mensagem sobre coisas que tanto faz que se saibam porque em nada servem para o que sabemos. E pode pôr a minha conta dos QUANDOS a zero, porque desde que fui ao seu blog, nunca mais repeti o lamentável erro. Recomeça a contagem?

Sempre atenta,
Sónia Sapage"

Ora aqui está um bom motivo para retomar este "Observatório"!
O uso do "Quando" não é proibido. Apenas não deve ser banalizado e, esta semana, notei (numa análise nada exaustiva, refira-se e saliente-se) vários casos em revistas e semanários:

"Visão"
Sónia Sapage, já sabemos, está com o contador a zeros, mas sugiro que fale com a Alexandra Correia que na página 14 do "Visão 7" tem lá o seu "Quando" no início do texto "Francisco e Dario, os subversivos".
Pelo caminho, existe ainda um "Quando" no início do texto "Gladiadores à força" (sobre a luta de cães), na página 130 da revista, assinado por Paulo Barriga.

"Focus"
Aqui não há nada no corpo principal da revista, mas na secção "Auto" (que não tem números nas páginas), o jornalista Filipe Garcia começa com um "Quando" o texto sobre a F1 intitulado "Revolução em curso".

"Expresso"
O director José António Saraiva começa com um "Quando" a crónica da "Política à Portuguesa" e a correspondente do Brasil, a Iza, tem lá mais um texto, desta vez sobre a Elis Regina, com o "Quando" no começo. O último que vi dela foi aquele sobre a morte do Sérgio Vieira de Mello. Alguém, por favor, que a avise.

Matar o Bill

O Guerra e Pás não gostou do 4º filme do Quentin Tarantino, "Kill Bill".
Eu gostei.
É interessante ver alguém falar tão mal de um filme do qual nós gostamos, pois isso mostra que existe pluralidade, diálogo e troca de ideias. Há opiniões diferentes e, ainda por cima, como muitas vezes fui levado a concordar com o Guerra e Pás, é bom poder ter finalmente uma opinião contrária à sua.
Aqueles que muitas vezes concordam comigo não me provocam grande emoções: acho que se concordam comigo, então é porque devo ter dito algo óbvio, sem grandes motivos de alegria apenas por haver alguém a concordar com as minhas ideias.
Gosto imenso de ouvir as opiniões contrárias às minhas, pois isso permite-me pensar nos meus argumentos, ver se estão verdadeiramente solidificados. Se não são inabaláveis.
Por isso, aqui respondo ao Guerra e Pás: "Kill Bill" pode não ser o melhor filme de Quentin Tarantino, mas apenas porque não é como os outros três, daí­ que ele tivesse colocado no tí­tulo a menção ao "4º filme". Não é como os outros, mas o tempo nos dirá.
Concordo que seja um exercício de estilo e, quanto ao facto de dizer que está mal filmado, devo dizer que não me preocupei com o caso (se bem que acho que a cena da luta no restaurante tem duas décimas de segundo a mais...) Mas, agora compara-se o realismo da cena com a fantasiosa luta similar do segundo "Matrix"... É grande a diferença.
As cores de Tarantino estão lá. A banda sonora está lá (e já roda por aí­... No sábado à  noite, durante o desfile de Nuno Gama, no Portugal Fashion, a música era do "Kill Bill").
Para quem também gosta de banda desenhada, estão lá os desenhos e planos de Frank Miller, melhor do que no próprio filme do "Daredevil" (esse sim, uma desilusão) e ainda as motos do "Akira".
O filme é parco em diálogos, que sempre foi a marca registada do realizador. Mas, tem aquela excelente cena de abertura quando a criancinha chega da escola e ainda quando Uma encontra o fabricante de espadas samurais pela primeira vez. Diálogos que valem por muitos.
Digo ainda que nem sequer sou grande apreciador de filmes de lutas. Por isso, como gostei do filme, achei que ele nem sequer é de lutas.
Cada imagem é uma imagem. É Tarantino. Melhor ou pior do que os outros? Apenas diferente e ainda bem. Não tem história? Não tem drama? Não tem personagens?
Aconselho a ver o filme uma segunda vez. Vejam se isso importa. Confesso que gostei de andar para trás e para a frente na história, como sempre fez Tarantino. À descoberta. A grande jogada de Tarantino é dar-nos tudo, mas na ordem natural das coisas: aos solavancos. Adoro.
E devo dizer que estou "mortinho" para "matar" o meu tempo a ver o próximo...

Harry Potter e Portugal (correcção)

O "post" anterior terminava com a menção do cemitério onde Amália Rodrigues esteve sepultada antes de ir para o Panteão Nacional. Por lapso, referi o nome Prado do Repouso em vez do Cemitério dos Prazeres.
Prado do Repouso não é nenhuma alegoria, como alguém poderia pensar. É mesmo o nome de um cemitério, mas no Porto (isto dos nomes dos nossos cemitérios tem que se lhe diga).
Reparei ontem no lapso quando, a caminho da estação de Campanhã, passei à porta do Prado do Repouso e vi a romaria muito própria do primeiro fim-se-semana de Novembro.
Tentei depois perceber o que me teria levado a cometer um erro tão primário, como o de confundir o nome de dois cemitérios em diferentes cidades. E creio que cheguei a uma conclusão: poderá ter sido um daqueles lapsos do inconsciente, por o cemitério Prado do Repouso, um belo cemitério cheio de obras arquitectónicas de cariz fúnebre e inspirador (se quisermos) de acções de feitiçaria, ter uma entrada perto do fim da Rua Duque de Saldanha.
Esta é a rua onde viveu JK Rowling quando esteve no Porto.

20031101

Harry Potter e Portugal

No domingo passado, ao ouvir Marcelo Rebelo de Sousa na TVI (não atentamente, mas entre várias coisas que então fazia ao mesmo tempo), reparei que ele criticara a utilização do Panteão Nacional para o lançamento da mais recente tradução do sucesso de literatura juvenil, Harry Potter.
Escrevi logo aqui um "post" a manifestar também o meu espanto no caso. Mas, as minhas razões da indignação nem eram tanto pela utilização do Panteão Nacional para um evento cultural. Sobre isso, até me sinto inclinado a concordar com Francisco José Viegas, que escreveu no seu Aviz que a escolha do local é uma forma de dar vida aos nossos heróis das letras e artes que ali repousam.
A minha crítica tem outras raízes.
Para quem me conhece, sabe que sou do Porto. Em 1992, trabalhava então no diário "O Primeiro de Janeiro", onde, para além dos trabalhos de jornalista, escrevia ainda aos domingos uns pequenos contos de Roque Gomes, "O detective da baixa portuense".
Isso durou perto de um ano, até 1993.
Não vou, nem sequer pretendo aqui dizer ou sugerir, que a autora de Harry Potter, JK Rowling, leu algumas das minhas histórias. Mas, por coincidência, esta foi a altura em que ela esteve a viver no Porto, casou, teve uma filha e depois separou-se do marido e regressou a Edimburgo, na Escócia.
Há uns tempos tentei entrevistar o ex-marido de JK Rowling. Não quis dar nenhuma entrevista, mas fiquei ainda a saber que, por exemplo, ele tem laços familiares com um outro autor português de livros juvenis. Também do Porto. Sei bem, portanto, o poder criativo que aquela cidade nos inspira. Que o Harry Potter tenha lá também um personagem malvado chamado Salazar, igualmente se entende a alusão ao nome do nosso ditador, fruto dos anos que a autora viveu entre nós.
Por muito que lhe custe lidar com o passado, JK Rowling, tem uma dívida para com Portugal, em especial para com a cidade do Porto.
A nível criativo.
Não acho, por isso, que Portugal tenha uma dívida qualquer para com ela a nível pessoal.
No dia do lançamento da sua mais recente obra, JK Rowling não esteve presente na festa que se organizou em honra da sua personagem. Sei ainda que esteve recentemente perto do nosso País, em Espanha mais precisamente, para receber o prémio Príncipe das Astúrias.
Portugal continua ostracizado da sua rota pessoal.
Que terríveis segredos estarão aqui enterrados?
Foi só por causa disto que estranhei que lhe tivessem dado já, em vida, uma festa no Panteão Nacional.
Amália Rodrigues, por exemplo, ainda esteve uns tempos no Prado do Repouso antes de ser levada para aquele monumento nacional.